PARA LER E RELER

segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

TEMPUS FUGIT (O TEMPO FOGE)


"Porque tudo passa rapidamente, e nós voamos" (Sl. 90.10)

Tenho uma ampulheta. Ganhei de presente. Guardo com carinho e cuidado. Ela contabiliza apenas dois minutos (que parecem bem mais quando se fica olhando a areia do tempo cair). As pessoas reclamam que o tempo está passando mais rápido do que antigamente. Que antigamente? Moisés já fazia a mesma constatação. A noção do tempo é uma questão de momento e circunstância. É algo um tanto psicológico. Você já perguntou a um encarcerado se o tempo voa para ele? Eu já. Sua resposta foi que o tempo ali não passa!
Isso me faz pensar que a reclamação em relação ao tempo diz respeito a plenificação da liberdade na vida das pessoas. São tão livres que desejam que o tempo seja mais lento para aproveitar mais! Quem dera que esse meu pensamento fosse uma realidade. Quem reclamam são tão presos à rotina e ao estresse que desejam que o tempo seja mais lento e eles mais ágeis de forma a se libertarem de alguns compromisso e assumirem outros.
O tempo não passa para quem espera o diagnóstico, e passa rápido para quem se encontra de férias. A areia de minha ampulheta cai e me diz que dois minutos é o suficiente para desejar a todos que deixem o tempo passar em 2013. Ele não existe para constatação de velocidade, pois não é corredor. Somos nós que temos que aproveitar o tempo, o dia, as oportunidades... Minha ampulheta diz: acabou o tempo! Que pena, dois minutos não são duas horas! O ano de 2013 não será eterno!
A areia do tempo acabou de correr. Eu insisto em continuar. É preciso girar a ampulheta. O ano de 2012 acaba. É preciso começar 2013. Vem comigo para a bênção de Deus. Feliz Ano novo!

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

DEMOCRACIA: FÁBRICA DE ILUSÃO!



Sempre que abro um jornal encontro todo tipo de comentário político. É nessa onda que surfarei, pois sinto que é hora de meu desabafo. Minha tese sobre o Estado democrático é radical: “Democracia” é uma palavra inventada para iludir o povo e dá-lhe uma impressão de que estão decidindo alguma coisa.
Para defender esta “tese” vou à Atenas, berço da democracia. Ali os cidadãos se reuniam para decidir o futuro da polis (a cidade grega). O que significava o futuro da polis? O futuro dos cidadãos. Quem eram os cidadãos? Eram os escravos ou os livres? Não. Eram os poderosos da polis. Ali estavam eles cuidando de como continuariam poderosos, os escravos permaneceriam escravos e os livres sem merecimento algum. Os cidadãos tinham como dignidade o “ócio” e, por isso, não podiam trabalhar. Trabalho era coisa para escravos e livres que, como tais, eram indignos: o trabalho e o trabalhador!
Dali até os nossos dias tem sido assim. Os nossos representantes (conforme a ilusão da democracia) vão à Brasília (ou mesmo às Câmaras dos Vereadores) cuidar de nossos interesses (conforme a ilusão da democracia).
Democracia é uma palavra que em nome dela é possível fazer qualquer coisa até mesmo afirmar que somos livres, menos para não votar e pagar impostos (daí a César o que é de César!)! Do povo, pelo povo e para o povo! Onde foi que na História você viu essa realidade? Em nenhum momento! Os representantes não são do povo (e quando são deixam de ser, pois se tornam políticos!), nem pelo povo e muito menos para o povo. Até tenho pensado que a palavra "democracia" é formada por duas palavras tirânicas: demo = demoníaco, cracia = poder, isto é, poder demoníaco, dominador. Existe uma possessão no poder político. Tantos entrem quantos são possuídos. Quanto à fórmula para exorcizar tal espírito do mal, ou a perderam ou escondem-na muito bem!
Começo a imaginar que não importa o sistema de governo ou sua forma. Mais vale um ditador que promove o bem-comum (se é que isto é possível!) do que um democrata corrupto. A diferença entre um ditador e um democrata é que o primeiro, como não quis ser cínico, não perguntou ao povo se o aceitava. Ele tomou o poder! Já o democrata perguntou porque queria ser cínico! Nós ficamos com "dor de cotovelo" diante do ditador, pois gostamos mesmo é de produzir ditadores e cínicos. O ditador é sem o nosso consentimento! Desta forma, votamos num democrata (é claro, na ditadura não votamos!). Daí saímos contando o nosso grande feito: “Tornou-se ditador, mas fui eu quem o coloquei! E vou tirá-lo para colocar outro ditador”. Só que o nosso ditador é cínico. Ele finge que os interesses são do povo e que seu poder emana do povo. Exatamente. Tudo o que ele tem, gasta, manobra, superfatura e rouba emana do povo e nunca mais voltará para ele. Sejam bem-vindos à ditadura democrática!
Lamento que o Brasil tenha herdado uma falsa monarquia (a portuguesa) e uma falsa democracia (imitação do ensaio americano de democracia), mas viveu uma verdadeira ditadura (na ditadura não existe falsidade, apenas crueldade!). Entre a falsidade e a crueldade não existe um mal menor a escolher? Eu considero que não!
Deixando as “teses” de lado (fruto de desabafo!), um dado histórico nos remete à nossa realidade. Nenhuma sociedade foi capaz de suportar a corrupção. Impérios e governos caíram sob sua tirania. O que fazer diante dessa calamidade política?
Pedimos forças a Deus para pronunciá-la a resposta e muito mais para torná-la o antídoto desse mal que corroí a nossa nação e faz milhões de brasileiros vitima da tirania da política do enriquecimento ilícito. Indignação temos. Justiça pedimos: a divina e a humana! Da nossa cruz oramos: "Senhor, não os perdoem pois sabem o que fazem". A esses ladrões que olham para a nossa cruz pronunciamos: "Hoje não entrarás comigo no Paraíso (da consciência limpa)!" Pretensão? Não. Profecia? Sim. Quem for corrupto que atire a primeira pedra!
Antes que a última pedra seja usada, é necessário declarar minha esperança na democracia do amor. Esse poder que nos preenche e faz-nos buscar o bem do outro e assumir a sua dor. Para além da política (e poderia ser a partir dela!) essa democracia acontece de forma livre e humana. A bondade se espalha e ajuda. A fraternidade reúne e abraça. A amizade torna o diálogo saúde ao coração. Vejo anônimos tornando-se heróis nas ruas em sua presa de socorrer o caído, e dá a mão ao desvalido!
A democracia do amor torna o sorriso um gesto comum a todos e a arte de buscar o bem do outro uma forma de construir o caráter, de aperfeiçoar os sentimentos e de sentir o coração mostrando que a vida é bem melhor ao lado de alguém.
Acho que chegou a hora dessa democracia destituir a fábrica de ilusão e forjar a verdadeira força que emana do povo: a solidariedade! Quem tem esperança que jogue fora a primeira pedra e assuma a dinâmica nascida do Reino de Deus que destitui o egoísmo e proclama a oração do Senhor: “Pai nosso... seja feita a tua vontade”! “Encontraram-se a graça e a verdade, a justiça e a paz se beijaram” (Salmo 85.10).

quinta-feira, 27 de setembro de 2012

A GRAÇA E A PAZ DE DEUS




A graça e a paz encontram-se entre as bênçãos que nos é garantida como forma de demonstração do amor e cuidado de Deus por nós. Graça é paz, e paz é graça! Aquele que tem a graça e a paz de Deus é plenamente rico. Ele tem o favor de Deus e o seu refrigério constante. Nada lhe falta e guerra nenhuma lhe perturba. O crente deve ter por certo que Deus é com ele por graça, liberalidade e amor!
O desejo de cada seguidor de Jesus para com as pessoas é que elas obtenham a graça e a paz de Deus. Essa deve ser nossa saudação inicial e final. Ofereçamos não apenas de boca, mas principalmente de coração! Permeados de graça e paz deve ser os nossos relacionamentos com cada irmão e amigos. Longe de nós, desejar o mal a alguém ou praguejar. Aquele que recebeu da graça e da paz de Deus, deve abençoar as pessoas com a mesma dádiva recebida. Nada é mais intenso, profundo e realizador do que viver na graça e na paz de Deus. Nada é mais gerador de bem-estar e contentamento do que abençoar os outros com a graça e a paz de Deus!
A graça é a ação amorosa de Deus que nos assiste em nossas necessidades apenas porque o Senhor é bom e sua bondade permanece para sempre. Não devemos esquecer que somos salvos pela graça: a rica misericórdia de Deus, motivada por seu grande amor por nós, que nos deu vida em abundância ao nos ressuscitar da morte dos nossos pecados (Ef. 2.4-6). Essa é a riqueza da graça! Ela nos basta e é suficiente para nos sustentar e nos fazer suportar os espinhos na carne – os problemas (2Co. 12.9).
 A paz é a presença de Deus em nosso coração de forma a levá-lo pelos pastos verdejantes e tranquilos de seu amor (Sl. 23.2-3). Essa paz é tão abençoadora que excede a todo o entendimento. Ela é capaz de guardar o coração e a mente das perturbações da ansiedade (Fl. 4.7). A paz de Deus é o divino ato limitador da ação desastrosa da ansiedade na vida crente. Ela se torna capacete e escudo que protege a mente e o coração para que a ansiedade não impeça que a graça se torne gratidão (ações de graças) em nosso coração.
A pressão e a dúvida não podem tirar-nos a graça e a paz de Deus. É a voz do Espírito Santo que ouviremos sempre. Ela está dizendo agora mesmo: ‘‘Não tenha medo. Deus está com você por onde quer que você ande’’. C. H. Spurgeon, considerado o Príncipe dos pregadores, é pontual: “A fé sobe pelas escadas que o amor construiu, e olha pelas janelas que a esperança abriu.” O amor do  Deus por você constrói os degraus para a sua fé andar, e a fé em Deus vê os degraus que o divino amor construiu. Olhe todas as coisas através das janelas que a esperança abre para você. Em cada janela que se abre para você ver Jesus em todas as coisas, você dirá: "O meu socorro vem do Senhor, que fez o céu e a terra" (Sl. 121.1).
Resumindo: a graça é Deus cuidando de nós, e a paz é ele conosco! Seja esse o nosso desejo permanente a todos que conosco tem contato: que a graça e a paz de Deus sejam com eles! Que a a graça e a paz de Deus sejam com você!

sexta-feira, 10 de agosto de 2012

LIVRES E SERVOS!



Lutero escreveu: "Para conhecermos a fundo o que é uma pessoa cristã e sabermos em que consiste a liberdade que Cristo adquiriu e lhe concedeu (do que S. Paulo tanto escreve), quero apresentar estas duas frases: Um cristão é senhor livre sobre todas as coisas e não está sujeito a ninguém. Um cristão é um servo prestativo em todas as coisas e está sujeito a todos". Liberdade e servitude - coração livre e coração servo: isso é Cristianismo! Cristo nos libertou para não sermos escravo da tirania do outro e nos tornou servo para não sermos escravos da tirania de nós mesmos. Liberdade sem servitude é egoísmo, e servitude sem liberdade é prisão! A verdadeira liberdade está no servir, e o verdadeiro servir está na liberdade. Quem serve por ser livre é abençoado, e quem é livre porque serve é feliz. Essa é a beleza e sentido de ser cristão.

terça-feira, 12 de junho de 2012

A ESSÊNCIA DA HUMANIDADE



Outro dia, voltei a assistir o filme intitulado O Homem Bicentenário (1999). O protagonista é um robô chamado Andrew (Robin Williams), que é diferente de todos por desenvolver sentimentos, criatividade e senso de liberdade.
Uma máquina não tem sentimentos. Pelo menos até hoje! Mas toda história tem um desenrolar e aquele robô necessitava de outra engrenagem para comunicar seus circuitos emocionais. Eu mesmo gostaria que aquele gatinho no canto esquerdo do meu computador fosse emocionalmente capaz. Não quero um gato acariciando as minhas pernas com aquele ar de mimo (nada contra aos animais de estimação!). Gostaria, apenas, que aquele gatinho quebrasse a minha solidão vivida nas noites sob a companhia da celulose (livros).
Não encontrando outra espécie eletrônica como ele, e no auge de sua desilusão, faz amizade com um cientista e investe suas economias em pesquisas para torná-lo mais parecido com uma pessoa. Ah! Esqueci de dizer que esse robô, emocionalmente capaz, tinha uma gorda conta bancária - fruto de seu trabalho. Ou você acha que as emoções não são capitalistas?!
No dia de fazer a plástica, é alertado pelo cientista sobre a importância dos defeitos no corpo para a pessoa humana. Ao mostrar um defeito no seu nariz, o cientista diz: ''É esse defeito que me torna único!''.
Ser único é o que existe de especial no ser gente. Até mesmo um clone é único! O rio não é o mesmo, como sugere o filósofo Heráclito, ao correr em seu leito. Assim, ninguém mergulha no mesmo rio duas vezes. O ser humano não se repete. A existência possui essa grandeza: a ausência de monotonia. Quem torna a vida monótona somos nós, pois a própria existência humana é uma experiência fantástica e uma aventura por um mundo novo a cada instante.
Outro dia caí em crise de insignificância diante da velocidade do tempo, das lutas e sonhos que insistem em surgir sem pedir permissão. Talvez Buda estivesse certo. O sofrimento humano é causado pelo desejo. Não será o desejo a essência constitutiva da pessoa humana? É claro que um desejo não realizado produz sofrimento e decepção. Devo enfatizar: a decepção é própria de nossa humanidade! Todavia, um desejo realizado coloca-nos diante de uma experiência magnífica: a felicidade. Possivelmente, a causa do sofrimento humano seja a felicidade e não o desejo. A felicidade é essa ''droga'' que uma vez experimentada quer-se mais e mais e nunca se terá permanentemente, mas somente a ilusão de tê-la - pelo menos aqui! E, com certeza, o sofrimento é causado por essa ilusão de uma felicidade idealizada que somente existe em contos de fadas.
Buda que me perdoe. Eu quero viver esse “carma” com intensidade: quero sonhar. E sofrer por sonhar! A dor tem uma função muito importante. Ela nos mostra que somos humanos e não anjos, demônios ou máquinas. A vida tem que ser ferida, de vez em quando, para que possamos despertar do sono da passividade e começarmos a contar a batida do coração, o número das estrelas, e das folhas que caem e são levadas pelo vento; pois somos também estrelas, folhas secas, vácuo, gente... Só perceberemos isto quando a nossa amiga morte nos enamorar. Ai seremos mistério! Nada se cria tudo se transforma, eis a máxima da Ciência (Lei de Lavoisier)! O pó volte ao pó e o humano volte a Deus que nos deu a oportunidade de viver o milagre da vida e de ser pessoa no mundo. O velho se torna novo, eis a máxima da ressurreição!
Enquanto aguardo a ressurreição do corpo (e da vida) procuro essa essencialidade do ser pessoa diante do outro. Olho-me no espelho e sei que alguém vai encontrar um defeito no meu nariz. Minha humanidade não se encontra nos meus defeitos. Ela está essencialmente, sim, no reconhecimento deles e na coragem de fazer ecoar a significativa frase: Perdoe-me, por favor!

sábado, 12 de maio de 2012

A ARTE DE PLANTAR ESPINHOS



Tornei-me plantador. Antes apenas de sonhos, agora de cactos. Tenho alguns que mantenho sob o meu olhar carinhoso. O carinho mora mais no olhar do que nos gestos! O verdadeiro olhar é a arte de acariciar e de fazer protegido o que amamos. Quisera que meu olhar fosse como disse Fernando Pessoa: “O meu olhar é nítido como um girassol”. Poderia ele dizer que seu olhar é um girassol. E perderia a beleza do girassol e a grandeza do olhar que faz o girassol poético. A comparação serve para que não confundamos as coisas. Desta forma, girassol continuará a seguir o sol e olhar a contemplar sua beleza – do girassol e do sol.
Todo dia olho cada um dos meus cactos. Até parece um ritual. Talvez você esteja pensando como eu me tornei plantador de cactos (acho que não sou plantador, mas protetor porque não planto, apenas olho – mudamos de profissão com certa facilidade!). Creio que foi por inveja, e não por cobiça. Nós cobiçamos coisas, e invejamos pessoas. Essa é a lógica! Alguém me deu um cacto de presente e disse que tinha uma coleção com algumas dezenas deles. Naquele momento eu não cobicei a sua coleção, mas tive inveja da pessoa. Queria ter a capacidade de ver nos cactos o que essa pessoa via. Desse pecado capital já estou perdoado eu sei. E o melhor: não me tornei invejoso!
Antoine de Saint-Exupéry, em seu livro O Pequeno Príncipe, disse que somos responsáveis pelo que cativamos. Creio que somos também responsáveis por aquilo que nos cativa também. Responsabilidade é o nome que damos ao encantamento que sentimos quando o coração se abre para amar. E como cativei alguns cactos, preciso ser responsável por eles!
Falando do Pequeno Príncipe, creio que foi ele quem primeiro parou para refletir sobre os espinhos através de sua pergunta insistente: “Para que servem os espinhos?” Como resposta, o piloto, intentando se vê livre de sua incomodação, responde: “Espinhos não servem para nada. São pura maldade das flores”. Com indignação o Pequeno Príncipe responde: “Não acredito! As flores são fracas. Ingênuas. Defendem-se como podem. Elas se julgam poderosas com os seus espinhos...”. E creio que foi ele quem me ensinou que falar de espinhos é falar de coisas sérias. A seriedade de pensar que as coisas não são inúteis leva-me a pensar que a produção de espinhos também não. E nem a produção de um sorriso!
Vamos por parte. Espinhos são defesas. Eles não são a decoração dos cactos. Ao tentar proteger meus cactos, sinto-me na necessidade de me proteger deles! Incrível isto! Os espinhos nos outros são tidos como pura maldade. Mas como pode a maldade imperar quando a sobrevivência (a vida) é buscada como bem maior? Espinhos não são lanças que arremessamos. Eles estão lá. Nós é que nos arremessamos neles. Os espinhos são uma forma de nos sentir poderosos. Existe o poder que é sinônimo de tirania, mas o poder dos espinhos é outro. É o jeito do cacto dizer: “Eu preciso também viver!” O perigo de nossos espinhos é quando eles são afiados através do orgulho e se tornam pura maldade de quem os fabrica. Estão ali para ferir e não para proteger a flor que haverá de nascer entre eles!
O que nos cactos é defesa, aos nossos olhos é arte, ornamento. Talvez seja necessário olhar para os espinhos das pessoas como arte e beleza e não como pura maldade. Quem sabe esses espinhos foram forjados na sua luta contra os dores da vida. São espinhos que traz história, lágrimas e sofrimento. Não estão ali por pura maldade, mas como prova de que a vida produz também espinhos e não apenas flores.
O apóstolo Paulo trazia um espinho na carne (2Co. 12.7). Ele chegou a pedir a Deus para que fosse tirado dele esse espinho. Deus não atendeu seu pedido como ele desejava. Sua resposta foi: “A minha graça te basta, porque o poder se aperfeiçoa na fraqueza” (2Co. 12.9). Eis a arte de plantar espinhos! Por detrás dos espinhos encontra-se a fragilidade, e acima de tudo a esperança de que Deus faça nascer uma flor entre os espinhos de nossa vida e dos nossos cactos.

terça-feira, 1 de maio de 2012

Oração ao Deus amor!



Como se poderia falar corretamente do amor, se Tu fosses esquecido,
ó Deus do amor,
de quem provém todo o amor no céu e na terra;
Tu, que nada poupaste, mas tudo entregaste em amor;
Tu que és amor, de modo que o que ama só é aquilo que é por permanecer em Ti!
Como se poderia falar corretamente do amor, se Tu fosses esquecido,
Tu que revelaste o que é o amor;
Tu, nosso salvador e reconciliador,
que deste a Ti mesmo para libertar a todos!
Como se poderia falar corretamente do amor, se Tu fosses esquecido,
Espírito de Amor,
que não reclamas nada do que é próprio Teu,
mas recordas aquele sacrifício do Amor,
recordas ao crente que deve amar como ele é amado,
e amar ao próximo como a si mesmo!
Ó, Amor Eterno,
Tu que estás presente em toda parte
e nunca deixas sem testemunho quando Te invocam,
não deixa sem testemunho aquilo que aqui deve ser dito sobre o amor,
ou sobre as obras do amor.
Pois decerto há poucas obras que a linguagem humana,
específica e mesquinhamente, denomina obras de amor;
mas no Céu é diferente,
aí nenhuma obra pode agradar se não for uma obra de amor:
sincera na abnegação,
uma necessidade do amor,
e justamente por isso sem a pretensão de ser meritória!

(Extraído do livro de Soren Kierkegaard, As Obras do Amor)

quarta-feira, 7 de março de 2012

QUÍMICA DO AMOR: QUE BICHO É ESSE?



Nasci no início da década de setenta e sou ainda do tempo da influência do romantismo renascentista e do amor shakesperiano. O amor como conheci é aquele criado pelo romantismo da Renascença e tendo William Shakespeare e sua obra Romeu e Julieta como fundante. Esse amor unia poesia com sentimento: havia sacralidade e a busca pela não profanação do corpo, da alma e do outro por puro prazer instintivo. Era o início da modernidade – que tirou a poesia do amor quando começou a caducar depois de revoluções e guerras mundiais! Na caduquice da modernidade foi sacrificado o amor shakesperiano. Alguém poderá suspirar com alivio afirmando que, até que enfim, pois era somente uma versão imperfeita do amor em resposta aquela da medievalidade!
Hoje se ouve dizer que abandonou o relacionamento com alguém porque a “química do amor” acabou. Antes, em nome de Shakespeare, dizia-se que o romance acabou! Imagino como fica agora. Em crise de amor, procuro um psicólogo ou um químico?
Li o livro de Lucy Vincent, intitulado Por que nos Apaixonamos. O autor tenta mostrar como a ciência explica os mistérios do amor. O hormônio pode em sua falta ou presença determinar em muito o rumo de um relacionamento. Não descarto o valor da química e de suas interações. Todavia, quero resgatar a nossa persoalidade. Não sou adepto do evolucionismo e, por isso, estranho que o amor seja somente uma reação química que aflora nesses animais que insistem em andar ereto e tomar sorvete com os amigos!
Vejo na TV aqueles “famosos e famosas” afirmando que passou a fase do “ócio” e como são de uma espécie que adotou a infidelidade como padrão deve, na próxima vez, procurar outro parceiro mais apto para a permanência da espécie (quem já leu algo sobre a Evolução das Espécies de Darwin sabe o que estou falando). Lealdade sim, fidelidade não, o moto midiático que quer se impôr como padrão dos relacionamentos. O pior é que nós, que estamos na arquibancada da vida – telespectadores dos absurdos e das manias dos egos inflados ou murchos –, começamos a acreditar que é assim mesmo.
Por favor, você que é químico, ensine-me a fórmula da felicidade! Vamos ao laboratório. Quantas medidas de oxigênio, nitrogênio, hormônios e adrenalina são necessárias para evitar o vazio existencial? Quantas medidas para abolir a solidão produzida pela falta de carinho?
Se a química do amor é plenamente certa, então, os químicos são os senhores da vez. Preparem o divã ou as porções! Mas se Shakespeare estava certo, então, não profanemos o amor, pois somente ele é capaz de devolver a humanidade ao nosso coração. Humanidade que encontramos no sorriso, no carinho e no encontro com a pessoa amada!
É fácil culpar a química. Difícil é assumir erros, avaliar posturas, ter uma conversa sincera, e coragem de começar de novo e fazer o outro feliz.
Enquanto assumimos essa postura, abandonemos a intenção de levar o amor ao laboratório em busca das razões do amor. O amor é como a rosa. A rosa não tem “porquês”. Ela floresce porque floresce. O pedagogo e filosofo Rubem Alves escreve: “Meu amor independe do que me fazes. Não cresce do que me dás. Nada mais falso do que o ditado popular que afirma que ‘amor com amor se paga’. O amor não é regido pela lógica das trocas comerciais. Nada te devo. Nada me deves. Como a rosa que floresce porque floresce, eu te amo porque te amo”.
Agora, me lembro da cena de Romeu e Julieta em que ele sugere não profanar com um beijo sua amada. E vejo o jovem do Diário de um Sedutor, de Sören Kierkegaard, que depois de conquistar uma jovem (dormir com ela) já não ver mais mistério e se desilude. Vejo num o amor, e noutro a ilusão. Como a felicidade depende do amor que tudo sofre, tudo crê e espera (1 Co. 13.7)! Que digam os felizes no amor, e os infelizes na ilusão!

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Um dia de fúria



Gosto de filmes que nos fazem refletir sobre a vida e levam o coração para além dos anestésicos da rotina. Sempre que enfrento filas ou quando me submeto a qualquer tortura de descaso, lembro de um filme intitulado Um Dia de Fúria (1993), direção de Joel Schumacher.
Avenidas congestionadas. Nas lojas e restaurantes, o cliente raramente tem razão. A pressão da vida nas cidades incomoda qualquer um. Para Bill Foster, isso tudo é mais do que um incômodo. Para ele, chegou a hora de dar o troco. Foster assume essa postura enquanto abandona seu barulhento carro, num congestionamento danado e num dos dias mais quentes do ano. Michael Douglas é Foster, um cara comum em guerra com as frustrações do dia-a-dia. Um Dia de Fúria é a história de um homem comum, um suspense alucinado e não convencional que pergunta: “Estamos perdendo a calma?”
Fico imaginando que cada pessoa que existe no planeta já teve seu “dia de fúria”. Fúria: essa indignação em forma de raiva ou de ira acumulada durante todo o processo de desprezo, insensibilidade e rejeição que passamos na vida. Fúria: nascida como resposta ao desprezo à nossa vida pacata, às tentativas de diálogos sem resultados, ao descaso produzido por aqueles que se sentam detrás das “escrivaninhas”, e usando da função massacram nosso bom humor.
Filas cortadas para beneficiar amigos, o sistema da rede bancária que “sai do ar” justamente depois do meio-dia, quando falta meia dúzia de pessoas para chegar à nossa vez. As desinformações e morosidade que nos levam a pensar que estão nos fazendo de palhaço. A violência parece ser a última alternativa quando os meios dignos já foram aviltados pelo descaso! É nesse momento que dá vontade de jogar uma bomba naquela agência bancária que tudo anda menos a fila e de entrar com um trator dentro daquele hospital onde o atendimento fere mais do que a doença! Sou contra a toda e qualquer forma de terrorismo. E entre a vontade de fazer e o fazer existe uma grande diferença. Ela se encontra no bom senso - que não significa que os meus direitos terão sempre que saírem perdendo para que a normalidade do aviltamento continue. Indignar-se é também usar o bom senso!
Lamento o fato de que o nosso país não teve uma formação revolucionária. Sem o espírito revolucionário consideramos que o máximo que podemos fazer é fofocar baixinho. A ditadura e outros meios incutiram o medo em nós. Todo o sistema é para a domesticação social. Quando alguém, depois de sofrer contra sua moral, dignidade e bem-estar, tem seu dia de fúria, logo surgem os “domesticadores” para dizer: “Fulano parecia tão pacato, mas é tão ignorante e mal-educado!” Parece que em nosso país é crime indignar-se e agir por indignação. Martin Luther King Jr, prêmio Nobel da Paz (1964), disse: “O que me preocupa não é o barulho dos violentos, e sim, o silêncio dos justos.” Ficam todos olhando para a cara do outro dizendo com o olhar: “Os políticos estão nos roubando, esse banco está me fazendo de bobo...!” Porém, nenhuma voz ecoa. E se ecoa, a repressão do olhar do outro ou da máquina de opressão da domesticação o faz calar imediatamente - é necessário manter a ordem (do aviltamento de nossa pessoa)!
O que mais amedronta à impunidade é o escândalo. Eles querem que todos pensem que tudo está bem sem estar. Quando alguém grita: “Estão me roubando!” Eles gritam: “Aqui em nosso país não existe roubo! Cale-se!” E quem gritou fica imaginando que está sofrendo de algum problema mental ou está morando em outro país.
Estamos perdendo a calma? Sim. E mais do que isto. Estamos perdendo nossa dignidade, nossos direitos e nossa paz e tranquilidade. Os dias de fúrias podem ser mais constantes na vida de muitos. Até o próprio Jesus teve seu dia de fúria e indignou-se. A injustiça, o aviltamento e a impunidade têm limites. Felizes são os pacificadores, disse Jesus. Ai do momento em que é necessário a guerra para promover a paz! Dizia meu pai: “Por causa de um grito se perde uma boiada!”
Diga não a todo e qualquer terrorismo! Fuja da violência! A paz tem meios mais eficazes para restaurar a justiça. Que no “dia de fúria” não andemos pelo caminho do crime, da violência gratuita e da transgressão. Não existe coisa pior do que perder o direito por não agir no direito!
Espero pelo dia em que em vez de “dia de fúria”, tenhamos cada vez mais dias de paz, tranquilidade e respeito. Que a única fúria que impulsione o nosso coração seja para amar a Deus e ao próximo. Que a resistência através da não-violência seja sempre a nossa defesa!

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

SOLTAR PIPA E A TECNOLOGIA DOS SENTIMENTOS


Outro dia uma criança me perguntou quando eu ia brincar de pipa com ela. Minha resposta foi um sorriso e o adentramento na recordação.
Nas últimas férias, quando em visita à minha família, meu sobrinho me fez o mesmo convite. No momento, lembrei de como gostava de soltar pipa. A criança em mim pedia para novamente sorrir. Ao mesmo tempo parecia banal demais soltar pipa. Esse sentimento que tiraniza dentro de nós de contabilizar o que seja tempo perdido com coisas que parecem não produzir nada é a própria infelicidade querendo fincar sua morada em nosso coração. A felicidade não vive da lógica do tempo é dinheiro!
Aceitei, finalmente, o convite de meu sobrinho. Ali estava eu e meu sobrinho, em busca do vento. Ele disse para mim: “Chame o vento, tio!” Antes eu também convocaria outros para chamar o vento. Mas agora parecia que não sabia o que significava “chamar o vento”. Parece que desaprendi a arte de chamar o vento. É, desaprendi muitas coisas! Antigamente, eu assobiava para chamar o vento. Coisa de criança! Agora nem assobiar eu sei. Coisa de quem se deixa envelhecer e torna a arte de envelhecer em arte de morrer!
A pipa sobe. Fica tremulando no ar. O meu sobrinho estava plenamente encantado. “Tem que soltar mais linha, tio!” – gritou ele. Parecia até que estava numa pescaria. E quem sabe era. Eu estava pescando os sentimentos perdidos. Não gosto de pescar, pois não consigo fica muito tempo parado apenas esperando. Mas ali com a pipa ao ar, devia ficar parado esperando. Quem sabe na esperança da magia que uma vez me contagiou, e contagiava agora meu sobrinho, voltar a me visitar.
O tempo passa. Meu sobrinho não cansava de contemplar a pipa. Parece contente com o seu grande feito. Eu, porém, já esqueci essa arte. Apenas fico imaginando o que estou fazendo ali. Pipa no céu, vendo soprando... Não deveria estar no computador, na rotina, na busca por não perder tempo...? Mas estou ali. Sem computador e celular, apenas com a tecnologia dos sentimentos – a arte de ser feliz ao lado de quem gostamos.
Ali comecei a lamentar. O meu sobrinho um dia possivelmente perderá a arte de brincar com o vento como eu perdi. É necessário deixar as coisas de criança e viver as de adulto! É assim que os pais perdem o jeito de abraçar os filhos e de se encantar com a tecnologia do coração – a arte de ser feliz ao lado de quem a gente gosta. É quando o abraço, o carinho e a conversa perdem o sentido na contabilidade do tempo é dinheiro e já não produz a magia do encanto de amar e ser amado.
O sol começa a se pôr. E minha pipa me fez ver a primeira estrela brilhar. Ela me fez ver muitas outras coisas. Ela me fez ver meu sobrinho, minha vida, minha família, meu mundo, o entardecer, meus sentimentos...
Agora era minha vez de falar ao meu sobrinho: “Vamos para casa, pois estar escurecendo!” É sempre assim. As crianças nos chamam para fora de casa – para brincar e sonhar. E nós as chamamos para dentro de casa – para parar de brincar e nos ver assistindo televisão ou fingindo que estamos confortáveis com a vida.
Obrigado, Senhor, pela oportunidade de estar com o meu sobrinho e aprender a viver a graça de amar e ser amado. - Rev. Lucas Guimarães