PARA LER E RELER

terça-feira, 12 de junho de 2012

A ESSÊNCIA DA HUMANIDADE



Outro dia, voltei a assistir o filme intitulado O Homem Bicentenário (1999). O protagonista é um robô chamado Andrew (Robin Williams), que é diferente de todos por desenvolver sentimentos, criatividade e senso de liberdade.
Uma máquina não tem sentimentos. Pelo menos até hoje! Mas toda história tem um desenrolar e aquele robô necessitava de outra engrenagem para comunicar seus circuitos emocionais. Eu mesmo gostaria que aquele gatinho no canto esquerdo do meu computador fosse emocionalmente capaz. Não quero um gato acariciando as minhas pernas com aquele ar de mimo (nada contra aos animais de estimação!). Gostaria, apenas, que aquele gatinho quebrasse a minha solidão vivida nas noites sob a companhia da celulose (livros).
Não encontrando outra espécie eletrônica como ele, e no auge de sua desilusão, faz amizade com um cientista e investe suas economias em pesquisas para torná-lo mais parecido com uma pessoa. Ah! Esqueci de dizer que esse robô, emocionalmente capaz, tinha uma gorda conta bancária - fruto de seu trabalho. Ou você acha que as emoções não são capitalistas?!
No dia de fazer a plástica, é alertado pelo cientista sobre a importância dos defeitos no corpo para a pessoa humana. Ao mostrar um defeito no seu nariz, o cientista diz: ''É esse defeito que me torna único!''.
Ser único é o que existe de especial no ser gente. Até mesmo um clone é único! O rio não é o mesmo, como sugere o filósofo Heráclito, ao correr em seu leito. Assim, ninguém mergulha no mesmo rio duas vezes. O ser humano não se repete. A existência possui essa grandeza: a ausência de monotonia. Quem torna a vida monótona somos nós, pois a própria existência humana é uma experiência fantástica e uma aventura por um mundo novo a cada instante.
Outro dia caí em crise de insignificância diante da velocidade do tempo, das lutas e sonhos que insistem em surgir sem pedir permissão. Talvez Buda estivesse certo. O sofrimento humano é causado pelo desejo. Não será o desejo a essência constitutiva da pessoa humana? É claro que um desejo não realizado produz sofrimento e decepção. Devo enfatizar: a decepção é própria de nossa humanidade! Todavia, um desejo realizado coloca-nos diante de uma experiência magnífica: a felicidade. Possivelmente, a causa do sofrimento humano seja a felicidade e não o desejo. A felicidade é essa ''droga'' que uma vez experimentada quer-se mais e mais e nunca se terá permanentemente, mas somente a ilusão de tê-la - pelo menos aqui! E, com certeza, o sofrimento é causado por essa ilusão de uma felicidade idealizada que somente existe em contos de fadas.
Buda que me perdoe. Eu quero viver esse “carma” com intensidade: quero sonhar. E sofrer por sonhar! A dor tem uma função muito importante. Ela nos mostra que somos humanos e não anjos, demônios ou máquinas. A vida tem que ser ferida, de vez em quando, para que possamos despertar do sono da passividade e começarmos a contar a batida do coração, o número das estrelas, e das folhas que caem e são levadas pelo vento; pois somos também estrelas, folhas secas, vácuo, gente... Só perceberemos isto quando a nossa amiga morte nos enamorar. Ai seremos mistério! Nada se cria tudo se transforma, eis a máxima da Ciência (Lei de Lavoisier)! O pó volte ao pó e o humano volte a Deus que nos deu a oportunidade de viver o milagre da vida e de ser pessoa no mundo. O velho se torna novo, eis a máxima da ressurreição!
Enquanto aguardo a ressurreição do corpo (e da vida) procuro essa essencialidade do ser pessoa diante do outro. Olho-me no espelho e sei que alguém vai encontrar um defeito no meu nariz. Minha humanidade não se encontra nos meus defeitos. Ela está essencialmente, sim, no reconhecimento deles e na coragem de fazer ecoar a significativa frase: Perdoe-me, por favor!